Sempre fui desconfiada de gatos, quando era mais nova provavelmente me assustei com um dos 17 gatos da minha prima, mais somado a uma dose de comentários negativos como: “interesseiros” “ não se apegam aos donos” “traiçoeiros” e por aí vai em uma lista que poderia não ter fim.
Esse mês adotei um gatinho, se chama Geraldo e eu nunca fui tão feliz em conviver com um felino, descobrir o seu ronronado, o seu jeito tão único de demonstrar afeto, o miado com a pata na sua cara logo de manhã te acordando.
Lembrei daquela passagem do ensaio de Virginia Woolf quando ela olha pela janela e vê um “gato sem rabo”
“ a visão daquele animal abrupto e truncado caminhando calmamente pelo pátio, modificou […] a luz emocional para mim. Foi como se alguém tivesse deixado cair uma sombra. […]. Certamente, enquanto eu via o gato manx (gato sem cauda originário da Ilha de Man, no Reino Unido) parar no meio do gramado, como se também questionasse o universo, algo parecia faltar, algo parecia diferente. Mas o que faltava, o que estava diferente?” (p.22)
Me apropriei desse mesmo assombro da Virginia diante da vida, porém trazendo para um outro contexto, mas que não deixa de ser o mesmo questionamento: “ o que me falta, o que está diferente”?. Estava eu ali, observando o Geraldo nos primeiros dias, me assombrando e me maravilhando enquanto aprendia a me relacionar de um jeito novo, de um jeito nosso enquanto eu aprendia sobre o seu jeito, e ele o meu.
Toda essa história do gato é real, mas também uma metáfora para as coisas que seguem seu curso sem pedir licença. É preciso se permitir, e se abrir ao novo, ainda que se abrir para o novo possa ser muitas vezes assustador, confesso, mas diante da alegria, do amor e das boas descobertas eu continuo acreditando nas novas possibilidades de se relacionar. Existem amores-gatos? pensei esses dias, talvez, e se existe algum como o Geraldo eu certamente viveria, ainda que tivesse que cortas as unhas desse gato de vez em quando, afinal, um gato ainda é um animal e por mais que possamos domesticar os animais, o seu instinto ainda está ali, não costuma ceder as nossas expectativas.
Não domesticar talvez seja o aprendizado que Geraldo tem me ensinado a viver. Sigo desviando das suas mordidinhas ingênuas, e ele desviando da minha tentativa de fazê-lo ao meu jeito, ele, eu, ambos felinos selvagens.
E só para constar, estou cuidando de 4 gatos nesse exato momento e é incrível como é preciso não saber sobre para conseguir se relacionar com eles, cada um ao seu modo, individual. É linda essa liberdade, não?
Jessica, só quem começa a conviver de perto com os gatos conseguem apreciá-los. Aqui em casa foi assim. Eu e Izabel não tínhamos paixão por eles. Mas chegou o primeiro, o segundo e outros tantos ao longo dos últimos vinte e poucos anos. Hoje cuidamos de 17 gatos. Não sem sacrifício. Nosso filho caçula, neurodivergente, teve neles um imenso apoio. Viva os gatos!!